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Isolamento social x Privação de liberdade

Tenho acompanhado em redes sociais muitas pessoas comparado o estado de isolamento social à vida na prisão. Sim, muitas pessoas acreditam que sua experiência de isolamento social doméstico se iguala a vida de uma pessoa vivendo em unidades prisionais no Brasil. O mais curioso sobre esses comentários é que eles partem de uma parcela da sociedade que desfruta de alguns “privilégios” como alimentação diária, água encanada, acesso a internet e a informações sobre cuidados de saúde e higiene. Apesar das orientações decretadas pelo estado e município, as pessoas ainda podem sair para fazer compras, ir ao banco, e alguns até se arriscam a fazer corridas ou caminhadas de lazer. Então caras e caros leitores/as, comparar a sua vida no período de isolamento social a vida de uma pessoa apenada é no mínimo uma comparação muito esdrúxula. Creio eu que isso aconteça devido a total falta de informação da maioria dessas pessoas sobre a vivência no cárcere. Não, este não é o meu “lugar de fala” também. Nunca cumpri medida socioeducativa na adolescência e não fui presa até então.  O que trago aqui é apenas a reflexão de quem aprendeu a ouvir e a enxergar que eles e Elas Existem. A lógica punitivista não nos permite se quer pensar que milhares de pessoas estão neste exato momento, em que você lê estas breves linhas, privadas de liberdade e não somente dela. O sistema prisional brasileiro estende a pena de privação de liberdade a outras diversas privações. Todas se organizam para que a maior delas aconteça, a privação da humanidade.  No atual contexto de Pandemia, as orientações que chegam dos principais órgãos de saúde, são de reforço nos hábitos de higiene como lavar as mãos, tomar banho, evitar compartilhar objetos, manter uma alimentação equilibrada e o principal, manter um distanciamento físico. Agora pensem como isso seria possível dentro de um espaço onde habitam vários seres humanos dividindo poucos metros quadrados? Para muitos a leitura deste texto se encerrará aqui. A lógica punitivista talvez te faça pensar que se o sujeito tivesse pensando nisso antes de cometer o crime não estaria passando por isso. Confesso que eu também já flertei com esse mesmo pensamento tempos atrás. Fiz isso antes de entender que não é normal que seres humanos devam dormir no chão e nem mesmo ficar confinados em poucos metros quadrados com vários outros seres humanos no mesmo local onde irão fazer todas as suas necessidades básicas, desde alimentação até as fezes. Nem vou entrar aqui no mérito sobre falta de acesso a atendimento médico, educação, assistência religiosa e conhecimento sobre seu processo, tudo isso previsto pela Lei de execuções penais, vou deixar esse papo para outro dia. Agora quero focar sobre esse olhar simplista sobre a privação de liberdade. Comparar seu isolamento doméstico a vida de uma pessoa presa é algo que precisa ser revisto. Que tal aproveitar esse período de quarentena para aprofundar suas leituras sobre o encarceramento no Brasil? Que tal conhecer o trabalho de instituições e de pessoas que atuam dentro do sistema ou que já passaram por ele? Fica aqui um convite e também uma reflexão sobre como a chegada do Corona Vírus no Brasil atinge de maneiras diferentes as diferentes parcelas da sociedade. Nossas desigualdades nunca foram tão latentes.

Elas Existem e nós Existimos.

Segunda diretora:
Maria Priscila dos Santos de Jesus

Este post tem 13 comentários

  1. Harison de Jesus Santos

    Excelente reflexão! De fato as pessoas falham em querer comparar o isolamento social com o cárcere. Concordo que esse período de quarentena deva ser ultizado para buscar ter conhecimentos sobre esse e outros assuntos que nos envolve dia a pós dia.
    Forte abraço a todos.

  2. Edmilson Ferreira

    Uma reflexão necessária… Já tive alunos em situação de cárcere ou sofrendo medidas socioeducativas eles exitem!

  3. Daniela Freitas

    O texto é perfeito! Não tem como comparar. Estamos presos em nossas nas casas com toda tecnologia do nosso lado, uma dispensa abarrotada, álcool em gel, água e sabão a vontade. Vamos as ruas em busca do que faltar. Temos direito a saúde, coisa que essas pessoas nunca tiveram e agora mesmo que não terão. Infelizmente.

  4. Railma Santos

    De fato, Pri! Essa é uma reflexão necessária. Creio que o termo prisão é usado toscamente pela população brasileira, pois chamamos de prisão tudo o que julgamos que limita o nosso direito de ir e vir.
    O encarceramento em massa de pessoas pobres e quase todas negras no Brasil, certamente é uma das razões para que tenhamos um desconhecimento absurdo sobre a realidade do sistema prisional brasileiro e também uma tranquilidade em desumanizar as pessoas encarceradas. Parabéns pelo texto!
    Elxs existem!

  5. Railma Santos

    De fato, Pri! Essa é uma reflexão necessária. Creio que o termo prisão é usado toscamente pela população brasileira, pois chamamos de prisão tudo o que julgamos que limita o nosso direito de ir e vir.
    O encarceramento em massa de pessoas pobres e quase todas negras no Brasil, certamente é uma das razões para que tenhamos um desconhecimento absurdo sobre a realidade do sistema prisional brasileiro e também uma tranquilidade em desumanizar as pessoas encarceradas. Parabéns pelo texto!
    Elxs existem!

  6. Mille Fernandes "Makyesi"

    Excelente e necessária reflexão, minha malunga querida.

    Peço permissão para compartilhá-lo.

    Saudações de Angola!

  7. Elaine Marcelina

    Parabéns Priscila, belo texto, ótima reflexão e obrigada por nos chamar a olhar além de nossos umbigos, olhar a volta, é além de nossa zona de conforto. Sucesso preta!

  8. Dyna Ribeiro

    A sua reflexão é muito pertinente. As pessoas tem o hábito de apenas repetir o que ouvem, não buscam conhecer o que de fato estão dizendo.
    Aproveitar a quarentena para buscar novos conhecimentos é a melhor forma de aproveitar o tempo que quase nunca temos.

  9. Dyna Ribeiro

    A sua reflexão é muito pertinente. As pessoas tem o hábito de apenas repetir o que ouvem, não buscam conhecer o que de fato estão dizendo.
    Aproveitar a quarentena para buscar novos conhecimentos é a melhor forma de aproveitar o tempo que quase nunca temos.

  10. Marize Conceição

    Some a todo esse processo, o fato de os apenados ainda durante o isolamento social ficarem sem direito a visitas e também por isso, na maioria das vezes ficam sem acesso a material de higiene e limpeza (o Estado deveria mas não fornece), tão necessário em seu dia a dia, principalmente diante da ameaça de contaminação e a certeza da morte certa neste caso. E além de tudo, a falta de notícias que gera insegurança e incerteza em relação a saúde de seus familiares. Nada disso interessa a sociedade que pensa estar imune ao que acontece no sistema prisional. Reflexão necessária em tom perfeito!!

  11. Marize Conceição

    Some a todo esse processo, o fato de os apenados ainda durante o isolamento social ficarem sem direito a visitas e também por isso, na maioria das vezes ficam sem acesso a material de higiene e limpeza (o Estado deveria mas não fornece), tão necessário em seu dia a dia, principalmente diante da ameaça de contaminação e a certeza da morte certa neste caso. E além de tudo, a falta de notícias que gera insegurança e incerteza em relação a saúde de seus familiares. Nada disso interessa a sociedade que pensa estar imune ao que acontece no sistema prisional. Reflexão necessária em tom perfeito!!

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